Este post é sobre vendas. A venda do carro em sí é só uma desculpa para escrevê-lo.
Eu sou fascinado em vendas. E a relação natural que esse assunto gera entre vendedor e comprador, envolvida pela negociação.
Recentemente, aconteceu um episódio peculiar na minha vida: a primeira vez que vendi um carro, o primeiro carro que comprei.
Quais semelhanças seriam possíveis entre vender um serviço de consultoria em Marketing na React, e vender um carro? Sendo que o primeiro é algo totalmente personalizado, envolve trabalho humano e decisões demoradas, enquanto o segundo é em sua essência a venda de um bem material que foi produzido em série?
Neste texto vou relacionar essa semelhança. Continue lendo, e pretendo mostrar que quando se trata de venda, nenhum conceito é descartado.
Contexto da Venda
Em curtas linhas, resolvi vender meu primeiro carro, Volkswagen Gol. Modelo: Power 1.6 8 válvulas motor AP. Estava com ele há 8 anos.
A primeira coisa que fiz foi um anúncio bem diferenciado, para destacar o carro. Nesse anúncio criei um texto bem raro de se ver em classificados.
O texto original ainda está disponível aqui
Realmente era um bom produto. Não é tão confortável quanto um carro seminovo, mas tem todo o benefício de facilidade de peças, manutenção simples, e etc.
Enfim, esse não é um post sobre mecânica. Vou falar somente o necessário sobre o carro, até porque, já foi vendido! haha
Antes de Tudo: Encontrar o perfil do cliente ideal
Feito o anúncio, é a hora de começar a receber as ofertas, filtrar os golpes e curiosos, e com sorte, começar a marcar as visitas de potenciais compradores.
Nesse mercado, a verdade é que o valor do produto não está no produto em sí, mas na cabeça do comprador:
Se ele entender que é o momento de trocar de carro, que aquele carro é para ele, que o valor está compatível e que é de boa procedência, a venda está feita.
E ai vem o primeiro insight: se você trocar a palavra “carro” por “fornecedor de marketing”, faz todo sentido. Estamos falando de:
- Timming de contratação;
- Fit de cliente/produto;
- Valor compatível com preço;
- Confiança no fornecedor.
Outro insight: Toda venda tem um funil, veja:
- 700 visualizações de anúncio (OLX estimado + FB)
- 28 Leads (pessoas que entraram em contato)
- 3 Leads Qualificados (manifestaram interesse em ver o carro)
- 1 Venda realizada.
A venda foi feita após duas visitas, e isso tem tudo a ver com a definição de ICP. Vou descrevê-las abaixo:
Comprador Errado
Um comprador veio de longe (um pouco mais de 100 km) para ver o carro. Examinou o carro durante 4 horas. Apontou praticamente todas as imperfeições do carro.
Neste contexto, tentou baixar o valor para o máximo possível. Aceitei fazer a R$ 14.600,00 nas condições em que o carro estava. A venda quase foi feita, mas o PIX deu problema.
Marcamos para realizar a venda outro dia. Dois dias se passaram e o comprador enviou uma lista, atualizando sua proposta para R$ 12.000,00.
Considerando que o valor anunciado era 16.900, a proposta equivalia a redução de quase 30% do valor.
A justificativa: uma lista dos itens que seriam gastos no reparo que justificariam tal desconto.
Imediatamente recusei a oferta. Mas guardei a lista para mais tarde.
Comprador Certo
O comprador que levou o carro estava procurando um exemplar similar há quase 3 meses. Olhou pelo menos 6 carros diferentes e estava quase desistindo de sua busca (o tal motor AP 1.6).
Quando viu o carro por fora, sorriu. Quando acelerou o carro, sorriu. Quando abriu o capô, ficou feliz em confirmar que achou o que estava procurando. Na negociação, apresentou o valor que possuía, que era compatível.
Comprou o carro muito próximo do valor anunciado, abatendo somente R$ 400,00.
Em outras palavras, o valor foi reduzido em 2,3% do valor.
Porquê definir um ICP importa
Se ainda não está claro, vale a pena refletir sobre o ICP. Você tem clareza do perfil ideal de cliente da sua empresa?
Essa é a principal razão de eu estar escrevendo este post, por isso vou deixar em negrito: Observe o abismo entre 30% e 2,3%. É por isso que definir o ICP importa.
No mercado de serviço, o que mata a lucratividade é vender para o perfil de cliente errado.
Todos os dias milhares de empresas perdem margem porque vendem para as pessoas erradas.
Foi assim durante um tempo com a agência, e quase repeti isso na venda do carro.
O perfil de cliente ideal era: alguém que valorize a mecânica do carro, com ênfase no tal motor ap 1.6 de 8 válvulas, que muitos mecânicos apontam como “o melhor motor da história da volks”.
E ai ficou claro o tempo perdido com o cliente fora do perfil ideal.
O primeiro comprador procurava por estética. Todos os problemas reais do carro eram de estética (queimados de pintura, borrachas e plásticos ressecadas).
A verdade é que o primeiro não era o comprador ideal. Como este carro tem um motor “raro” de encontrar a venda, o caminho mais natural era “suspender” a venda no primeiro momento que notei que o motor não era o principal para o primeiro comprador.
Sem mais delongas, vou listar aqui todo o aprendizado desta negociação.
Conhecimento utilizado para trazer a melhor negociação
Definir o cliente ideal é o primeiro passo. O segundo é promover a melhor negociação possível.
Você pode seguir pelo caminho de estabelecer um inimigo, ou estabelecer uma negociação onde os dois possuam um interesse comum que é a realização da venda.
Então vamos para as técnicas / ações que consegui “aproveitar” de vendas B2B para realizar a venda do Golzinho.
Estabelecer Empatia
Essa é a prioridade no início da negociação. Ninguém vai comprar nem um real de você se não te considerar confiável.
A grande verdade é que nós compramos e vendemos para quem gostamos. Quando isso não acontece, manipulações entram no jogo.
Por manipulações, quero dizer: desconto, ofensas, problemas fictícios (um pouco do que aconteceu na primeira negociação).
Se você acha que isso é exagero: tente se imaginar comprar um carro de uma concessionária que “beirou a desonestidade” durante a negociação.
É claro que não é necessário fazer amizade com o comprador/vendedor, mas é preciso estabelecer o rapport: que se resume em estabelecer uma conexão de empatia entre as partes.
Retirar Objeções para facilitar a venda
A recomendação de um amigo entendido do assunto era simples: deixe o carro melhor possível, porque a pior coisa é perder tempo para mostrar para 5, 10 pessoas e não vender.
Lembra da lista que o primeiro vendedor fez? Imediatamente levei o carro ao mecânico, que:
- Limpou o motor, retirando a “má impressão” de vazamentos que na verdade não existiam;
- Atestou que a mecânica do carro estava em bom estado.
Quando ficou claro que o comprador seria atraído pelo motor, tudo o que foi preciso fazer foi limpar o motor, para facilitar ao futuro dono ver que ele encontrou o que estava procurando. Nesta mesma ideia, vendi o carro com o documento em dia e sem multas. Quando o segundo comprador perguntou sobre documentos, a resposta foi “está pago”.
Ele também tinha dúvidas se teria problema em passar o carro para seu nome durante a pandemia. O que fiz? mandei o link do site do detran que dizia que não era necessário. Parece bobeira, mas uma objeção a menos é uma possibilidade de venda a mais.
E o que isso tem a ver com vendas em B2B? Às vezes atropelamos as objeções e poluímos nossa comunicação (a sujeira do motor), dificultando o cliente ideal chegar a constatação de que aquela é a proposta/empresa/solução certa.
Repense sua comunicação, credenciais e proposta: mude ordem dos slides, pense nas piores perguntas que o cliente pode fazer sobre objeções, e esteja pronto para respondê-las.
Estabelecer um Diálogo Transparência
Com a parte da lista que dizia respeito a estética, não fiz nada: os queimados de pintura e borrachas ressecadas foram vendidos junto com o carro.
Naturalmente, falei tudo isso ao vendedor. Quando ele perguntou sobre o estado do carro, falei todos os pontos fortes, mas também os fracos.
O próprio comprador comentou que isso chamou atenção dele, e que criou confiança pois eu estava facilitando as coisas.
E assim como no mercado de “venda de carro”, também é raro achar transparência em empresas B2B.
Transparência também reforça a empatia.
Balizar valores, para não Gaguejar
O meu principal erro no primeiro vendedor foi responder “posso fazer por 15” quando ele perguntou “qual seria o melhor valor”.
Enquanto isso, o preço na Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) aumentou: Em março de 2021 custava R$ 17.500,00. Em Abril, R$ 18.600,00.
Em B2B, o que dá para aprender com isso?
Sempre que se entra em uma negociação é preciso ter o “piso” bem estabelecido, e não aceitar nada abaixo dele.
Até quanto vale cair a margem para atender um cliente? Isso é importante na venda de um carro, mas mandatório na venda de serviço, principalmente se este for recorrente.
Se você propõe um fee de R$ 10.000 mensal, e acaba fechando por R$ 7.000,00 e não “ajusta o escopo”, a cada fatura mensal você sentirá os R$ 3.000,00 indo embora. E não estou falando de margem operacional, estou falando de sentimento, que corrói aos poucos a relação entre contratada e contratante.
Caminhos para justificar o preço
Se alguém pergunta: por que o valor é esse, o que você responde?
Praticamente qualquer resposta serve, desde que seja dita com confiança. Se gaguejar, o preço abaixa.
Buscar conhecimento sobre o Produto
Existem ‘Golzinhos’ no mesmo ano, na mesma quilometragem, que são vendidos pelos tais R$ 12.000.
Porém, não são o mesmo motor, não estão na mesma condições. E tem os valores diferentes na tabela Fipe (que baliza os preços de carros usados).
Se eu não tivesse me informado sobre, certamente aceitaria os doze mil.
O aprendizado: quanto menos se entende do produto, menos você consegue defender o valor dele.
Eu tenho várias formas de acesso a empresas no mercado, onde encontro escopos idênticos à propostas que consigo vender, pela metade do preço. Isso pode acontecer provavelmente porque os vendedores (nesse caso englobo os diretores da empresa e seus executivos de vendas) não defendem, valorizam e reconhecem o valor do seu próprio trabalho, aceitando valores que os forçam a cair qualidade, alimentando o ciclo vicioso (e perigoso):
Valores baixos > margem baixa > salários baixos > estresse alto > resultado baixo > valores baixos…
Condições emocionais para não vender no desespero
O cenário atual do Brasil gerou uma valorização repentina em carros usados. O valor da Fipe e deste carro está maior que o valor que eu o comprei há 8 anos atrás. Isso gera uma situação de conforto, onde eu sinto que “não perco dinheiro” se for paciente.
Somado a isso, um amigo (Gilson) comentou comigo que esta venda foi feita nas melhores condições psicológicas: Já estava com outro carro e não precisava do valor da venda do carro “para ontem”.
Na prática, isso quer dizer que vendi em 20 dias, mas podia esperar 3, 4 meses para fazer esta venda.
Isso está totalmente ligado com a minha estratégia de venda na agência: nós possuímos uma reserva financeira que nos permite ter liquidez durante mais de meio ano, se todos os clientes saírem da noite para o dia.
Em outras palavras, está tudo bem se uma negociação não dar certo. Se uma proposta não fechar porque o cliente encontrou uma proposta por 15% a menos, não existe pressão interna para cobrirmos este preço. Dá tempo de ir ao mercado e buscar outro cliente.
A melhor valorização: Conexão Emocional do Produto
Um carro de 8 anos conta uma história. E quando essa história é contada, ajuda a mostrar as qualidades do carro.
Foi o carro que levou minha esposa para o altar. Não preciso falar muito mais que isso para mostrar o quanto nós confiávamos no Gol.
Esse foi o insight que pude constatar que mais me fez pensar sobre a forma que eu vendo os trabalhos da React, e ajudo empresas parceiras a venderem:
Você gosta do seu produto?
Você sente que vale o preço?
Considerando os benefícios e comodidades gerados, você pagaria o que está pedindo para o seu cliente?
Você sente emoções positivas ao vender?
Traduzindo a ideia para os nossos serviços: quando negociamos soluções B2B precisamos lembrar das forças que fundaram a empresa, de toda a equipe que faz o projeto acontecer, suas histórias e sua vontade de fazer dar certo.
Quem entra com esse pensamento na mesa de negociação está apto a defender os valores, encantar o cliente e fazer as melhores vendas possíveis.
Você concorda? Se sim, ou não, deixe seu comentário!
Agradecimentos:
Aos amigos Gilson, e Marcelo, que me ajudaram a trocar o carro. Ao Adrian, Eduardo e Pedro, que incentivaram a comprar outro (fica pra outro post). Ao Oséias (pai) e Sr. Laércio, que guardaram o Gol pra mim, e ao Heitor, o novo dono (sortudo).
Essa é a minha homenagem final a esse carro forte, compacto e companheiro que tive em minha passagem. Seja feliz, Golzinho!